O setor de radiodifusão está se preparando para enfrentar aquele que promete ser um dos mais delicados e complexos temas a serem tratados em um ano pré-eleitoral e em um momento de turbulências econômicas: a possibilidade de ter que vir a recolher o Fundo de Universalização das Telecomunicações (Fust) sobre suas receitas. A conta do problema já supera os R$ 850 milhões. Isso é, por baixo, o valor equivalente ao Fust (1% da receita bruta) sobre o que o setor de rádio e TV faturou entre 2008 e 2012 (R$ 85 bilhões, segundo dados do levantamento realizado pelo Projeto Inter-meios).
O papagaio depende de uma decisão da Advocacia Geral da União (AGU). É ela quem decidirá sobre duas interpretações jurídicas: uma da Anatel, exarada na semana passada em parecer da Procuradoria Especializada da Anatel sobre o tema, e a posição do Ministério das Comunicações manifestada também por meio da consultoria jurídica em 2006.
O fato que detonou o debate foi a decisão do Tribunal Regional Federal da 1a Região nos autos do Mandato de Segurança 2001.34.00.011095-0/DF, que em junho decidiu contrariamente a um pleito da Abert e ratificou o entendimento de que radiodifusão é serviço de telecomunicações. Esse assunto foi levantado pelo jornal O Estado de S. Paulo, na semana passada.
Essa interpretação (de que radiodifusão é telecom) não é exatamente nova, mas pela primeira vez a Justiça se pronunciou em decisão de mérito sobre o tema. Diante desse fato, a procuradoria da Anatel analisou o caso e entendeu que sim, a radiodifusão deveria também recolher o Fust, e que isso poderia ser feito tendo como base as receitas de publicidade, merchandising etc, já que essa fonte de renda só existe enquanto a empresa presta o serviço de radiodifusão na qualidade de serviços de telecomunicações.
O problema é que o Minicom, em 2006, teve entendimento divergente, e os dois pareceres (o atual, da Anatel, e o antigo, no ministério) tem o memso peso. Cabe à AGU decidir qual é válido.
Os radiodifusores já têm um plano de ação em mente. Obviamente, o tema vai escalar politicamente, ou seja, pretende-se mostrar que o governo pode estar, com essa medida, aumentando a carga tributária do setor de mídia, em um momento em que existe um esforço para convencimento de que é o setor de Internet quem deveria pagar impostos.
Depois, as TVs certamente alegarão que a procuradoria da Anatel exagerou ao considerar receitas de publicidade como receitas decorrentes do serviço de telecomunicações. O argumento é que, no caso de outros serviços de telecomunicações, receitas de serviço de valor adicionado, por exemplo, não entram na conta do Fust. Da mesma forma, operadoras de TV paga não pagam Fust sobre eventuais receitas publicitárias decorrentes da comercialização de espaços em seus canais.
Não se percebe, contudo, nenhuma intenção dos radiodifusores em questionar o seu enquadramento como empresas de telecomunicações. Aliás, na semana passada, quando Luiz Roberto Antonik, diretor executivo da Abert, tomou posse justamente como representante das empresas de telecom no Conselho Consultivo da Anatel, e ele mesmo fez questão de lembrar que a primeira lei que rege o setor de radiodifusão é o Código Brasileiro de Telecomunicações. Além disso, para as emissoras, manter umaa posição como espécie do gênero "serviço de telecomunicações" fortalece o peso da radiodifusão na briga por espectro.
Mas alguns aspectos podem complicar ainda mais o debate, segundo observadores ouvidos por este noticiário: por exemplo, a cobrança, por parte dos radiodifusores, pelo seu conteúdo quando estes forem distribuídos por empresas de TV por assinatura. Também seria essa uma receita decorrente da prestação dos serviços de telecomunicações e, portanto, passível de cobrança do Fust?
Outro problema é que não existe, na Anatel ou Ministério das Comunicações, nenhum registro sobre faturamento das empresas de rádio e TV, nem nenhuma obrigação regulatória de reporte dessas informações. Realizar a cobrança demandaria estabelecer uma metodologia que assegurasse essa fiscalização. São questões ainda não resolvidas.
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