Thursday, 23 July 2009

George Orwell e o Big Brother da Amazon

E a simpática Amazon, de quem só costumamos ouvir boas notícias, andou exercitando seu lado Big Brother. Isso porque um parceiro da grande loja pontocom vendeu ilegalmente cópias digitais dos livros "1984" e "Animal farm", ambos de George Orwell. A Amazon descobriu essa anormalidade graças ao DRM, tecnologia que gerencia os direitos autorais em obras digitais.

Pelo que se constatou, essas edições eletrônicas dos livros de Orwell não poderiam circular nos EUA. Por isso, o DRM "denunciou", digamos assim, que as tais cópias baixadas através do site eram ilegais. A tecnologia cumpriu seu papel. De quem foi a responsabilidade pela venda ilegal? Da livraria que vendeu através da Amazon ou desta, que permitiu o negócio sem checar questões relacionadas aos direitos autorais?

De qualquer maneira, o que fez, então, a Amazon? Simplesmente entrou remotamente no leitor eletrônico dos seus clientes, o Kindle, e detonou as tais cópias ilegais. Também anunciou que estaria reembolsando US$ 0,99 por livro apagado. Foram centenas deles. Os clientes começaram a receber comunicado de reembolso na última semana, sem explicação sobre o súbito sumiço dos textos.

Mas o ponto principal é: será que a Amazon tinha o direito de fazer o que fez? Não seria mais ou menos a mesma coisa que uma editora arrombar a porta lá de casa e levar embora todos os livros que comprei em camelôs mundo afora? Ou seria como uma gravadora entrar no meu computador e deletar todas as músicas que eventualmente (oh, que surpresa) andei baixando da internet nos últimos dez anos? Não foram poucas...

A discussão está esquentando nos fóruns especializados - como a ZDNet, onde comecei a capturar essa história, que já se espalha por muitos sites, blogs etc. A ideia geral é de que foi um abuso da Amazon. Mais do que isso, mostrou que a empresa tem um poder grande sobre seus consumidores. Se, por algum motivo, ela "decidir" que você não deve ler tal livro, ela simplesmente vai apagá-lo do seu Kindle, sem maiores explicações.

Como se comentou em algum dos blogs, isso mostra que você não tem, não possui, de fato, o tal livro no Kindle - a não ser que o transfira para o computador...

Nunca se viu nada parecido. Por isso, também se levantou a hipótese de livrarias e editoras parceiras começarem a perder confiança na Amazon, e isso seria um péssimo negócio.

O que também é bastante curioso é o fato de tanto ruído ter sido causado justamente a partir da obra do britânico George Orwell (1903-1950).

Para quem andava distraído: a literatura de Orwell é marcada pela discussão de temas políticos, com especial implicância em relação a regimes totalitários, daqueles que vão se metendo na vida particular do cidadão etc. etc. E foi Orwell quem criou - ou previu? - o Big Brother, o Grande Irmão, que se tornou símbolo da vigilância paranoica sobre os indivíduos.

Nada mais irônico, portanto, que esse episódio da Amazon envolva livros de George Orwell. Se estivesse vivo, ele não hesitaria em declarar algo na linha:

- Eu não disse que ia dar nisso?

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