O programador de Nova York, Barry Hoggard, leva a sério a questão de privacidade online. Neste mês, ele disse adeus aos seus 1251 amigos do Facebook e apagou sua conta, de quatro anos, em protesto ao que ele chama de políticas de privacidade corroídas nas redes sociais.
“Estou cansado de acompanhar minhas configurações do Facebook e quais opções devo marcar para me proteger”, afirma Hoggard. “Não tenho muitas ilusões sobre privacidade online, mas o Facebook foi muito longe.”
Do Facebook aos publicitários que podem colocar sua identidade online a venda pelo maior lance, e estranhos que podem acompanhar seus passos pela cidade, novos meios de utilizar a tecnologia e a internet estão tornando as questões de privacidade uma grande polêmica.
“A privacidade hoje não é o que era um ano atrás”, afirma o diretor do Centro para Democracia Digital, Jeffrey Chester. “Não faz muito tempo quando nos preocupávamos com anunciantes plantando cookies em nossos computadores”, diz Chester, que acredita que o controle de privacidade vai se tornar cada vez mais difícil.
Confira abaixo as ameaças que estão emergindo contra a privacidade.
Redes sociais
Será que as redes sociais estão ditando o fim da privacidade? Centenas de membros do Facebook que abandonaram suas contas acreditam que sim. Com 450 milhões de usuários, o Facebook influencia as decisões sobre privacidade das outras redes sociais.
Trocas de pequenas conversas e fotos de viagens tornaram o Facebook viciante para seus usuários.
Mas, com os anos, eles assistiram suas informações privadas sendo compartilhadas com uma esfera crescente de estranhos – os publicitários. E, neste mês, o Facebook fez mudanças às suas políticas de privacidade que expuseram mais dados pessoais a uma gama ainda maior de marqueteiros.
Uma das mudanças envolve o programa piloto Personalização
Instantânea, que permite aos sites parceiros do Facebook acessar os dados do usuário e moldar seu conteúdo. Com o recurso ativado, as informações pessoais são acessadas no momento em que o usuário acessa sites como o Docs.com, Pandora ou Yelp.
Quando o programa foi lançado, o Facebook o ativou automaticamente para todos seus usuários, mas a questão gerou polêmica e a companhia foi forçada a revisar sua decisão. A Personalização Instantânea agora é opcional.
A rede já havia sofrido com questões de privacidade antes. Em 2007, ela lançou o Beacon, um sistema de propaganda que acompanhava determinadas ações dos usuários do Facebook em 44 sites de parceiros. Muitos usuários se revoltaram, citando preocupações em relação a privacidade. O CEO da empresa, Mark Zuckerberg, se desculpou rapidamente e tornou o Beacon um recurso opcional.
“O Facebook está, literalmente, reduzindo as configurações de privacidade para seus usuários”, afirma o diretor do Electronic Privacy Information Center (EPIC), Marc Rotenber. No começo de maio, o EPIC e outros 14 grupos de consumidores entraram com uma reclamação contra o Facebook na Comissão Federal do Comércio. A ação acusa o site de seguir práticas de negócio injustas e enganadoras, em parte, por divulgar detalhes previamente privados ao público.
O Google Buzz também enfrentou problemas similares. A rede expôs uma lista dos endereços de e-mail de contatos mais utilizados de seus usuários quando o serviço foi lançado.
As redes sociais têm forçado seus usuários a pensar novamente sobre o que é a privacidade em um mundo no qual o compartilhamento público de vidas privadas se tornou comum, observa o especialista em leis de privacidade Jeremy Mishkin. “O verdadeiro problema é como garantir aos indivíduos que eles têm controle de suas próprias informações”, afirma Mishkin.
O Facebook recusou entrevistas, mas divulgou uma declaração: “É importante que o Facebook e outros sites ofereçam aos usuários um controle claro sobre quais informações querem compartilhar, quando querem compartilhar e com quem querem compartilhar. Estamos analisando feedbacks e avaliando a melhor forma de responder às preocupações.”
Coleta de dados
A criação de um perfil digital é bem mais fácil se você estiver conectado ao Facebook, Google Buzz ou LinkedIn. Não é novidade o uso do interesse do usuário em carros para oferecer um novo produto. Mas, será que algum dia o status do Facebook poderá ser utilizado por uma agência de crédito, agência de saúde ou futuro empregador para determinar se você é uma boa escolha?
Companhias como a Rapleaf afirmam que estão trabalhando com instituições financeiras para que seus bancos de dados de e-mails tenham também informações compartilhadas de redes sociais. O vice-presidente de desenvolvimento de negócios da empresa, Joel Jewitt, afirma que colabora com os departamentos de marketing da companhia, para oferecer serviços financeiros mais adequados aos clientes bancários.
A Rapleaf é apenas uma de muitas firmas, como a Acxiom e a Unbound Technology, que estão completando suas informações com auxílio de redes sociais, tweets e informações do LinkedIn. Se uma empresa precisar saber mais sobre você, basta utilizar um desses métodos.
Links offline para sua vida online
A primeira tendência para os marqueteiros é a combinação de dados online e offline para criar perfis digitais de internautas. Companhias como a BlueKai, DataLogic e Nielson estão trabalhando com publicitários para que eles alcancem os internautas com propagandas baseadas em seus comportamentos offline e atributos demográficos.
Os anunciantes destacam, com cuidado, que apenas informações não identificáveis são utilizadas e que as pessoas nunca são identificadas por seus nomes, mas sim por grupos demográficos.
As conexões entre os mundos online e offline são feitas por meio de um endereço de e-mail registrado pela companhia com a qual você faz negociações. Esse endereço poderia criar uma ligação com um perfil feito a partir de suas atividades online em sites como redes sociais. Ao cruzar as referências desse e-mail, os publicitários podem apresentar um banner com uma propaganda moldada de acordo com seus hábitos ou visões políticas expressadas no Twitter.
Isca de tubarão em tempo real
A segunda tendência é uma tecnologia de lances em tempo real que permite agências publicitárias como a Google e o Yahoo acompanhar os usuários na web e entregar propagandas terceirizadas personalizadas instantaneamente.
Funciona da seguinte forma: conforme você visita sites da internet, os marqueteiros dão lances em tempo real para mostrar lhe mostrar uma propaganda ligada a sua atividade online. Se você estiver lendo sobre uma câmera digital, você pode ver um anúncio do produto no próximo site que visitar. Se você comprar essa câmera, os publicitários podem, em tempo real, lançar uma propaganda sobre acessórios para o produto no próximo site.
Golpe duplo de privacidade
O aumento dessas duas tendências de marketing, que criam campanhas personalizadas e instantâneas, pode não ser uma surpresa real. Mas os ativistas de privacidade dizem que elas vão muito longe e que os publicitários estão acompanhando as atividades das pessoas e lucrando com suas informações de modo injusto.
“A maioria dos consumidores ficaria chocada ao saber que as companhias estão combinando detalhes de suas vidas online instantaneamente, sem o seu conhecimento”, afirma o membro da organização Public Interest Research Group, Ed Mierzwinski.
Chester, do Centro para Democracia Digital, afirma que esse tipo de publicidade implica em propagandas predatórias, como curas duvidosas para doenças ou empréstimos de grande interesse.
A transparência é uma chave para os publicitários, segundo o chefe executivo da Better Advertising, Scott Meyer. Ele diz que a indústria aumentou seus esforços para afastar a regulamentação governamental por meio de programas de autorregulamentação. Um deles é o ícone de transparência: ao clicar em um destes em uma propaganda, ela informa ao usuário que está utilizando dados de comportamento ou demográficos.
A Better Advertising oferece um complemento para navegador chamado Ghostery que alerta sobre acompanhamentos escondidos e permite bloquear esse tipo de atividade. O bloqueio só funciona no Chrome, mas o complemento também está disponível para o Internet Explorer e o Firefox.
Perseguição móvel
Sem uma configuração adequada no seu smartphone com GPS ou serviços de geolocalização, os publicitários podem saber onde você está e aproveitar isso.
Redes sociais como o Foursquare, Gowalla e Loopt foram desenvolvidas para facilitar a localização de amigos em restaurantes, bares e shoppings. Uma série de aplicativos para Android e iPhone utilizam informações de localização. O Facebook também diz que integrará recursos de compartilhamento de locais ainda em 2010.
Esses serviços alertam aos consumidores que sejam cuidadosos em relação ao quanto revelam sobre si. Em fevereiro, grupos de privacidade pediram aos legisladores que limitassem o quanto os publicitários podem acompanhar os usuários por meio desses serviços. Segundo eles, as regras para serviços baseados em localização e publicidade estão vencidos e obsoletos.
Pressão a ponto
Serviços de geolocalização baseados em recompensas como o Foursquare, que dá cupons e pontos para membros que revelarem suas localizações, geram essa preocupação.
“Você precisa considerar se há alguma informação na sua localização que você não queira tornar pública”, afirma o especialista do grupo Electronic Frontier Foundation, Peter Eckersley. Ele cita exemplos de visitas à igreja, reuniões políticas ou clubes noturnos: “Há pessoas que podem usar essas informações contra você?”
Na mira de propagandas móveis
Alguns especialistas ainda se preocupam com a vontade de publicitários de penetrar em uma indústria de marketing móvel direta. A rede social móvel Loopt diz que está desenvolvendo um sistema de propaganda que pode lançar ofertas aos clientes de uma determinada loja no momento em que eles entram nela. A companhia diz que os marqueteiros querem alcançar as pessoas no momento em que eles fazem uma decisão de compra.
Aplicativos executados em smartphones e gadgets com serviços de localização, como o iPad, também preocupam ativistas de privacidade. “Com a ajuda da tecnologia de GPS, cada publicitário saberá onde você está e o que você está fazendo com seu celular”, afirma Chester. Esses programas ou até mesmo e-readers saberão, por exemplo, o quão perto você está de um shopping, restaurante ou escritório.
Podemos parar de nos preocupar?
Qual é o futuro da privacidade? Será que teremos de concordar com o CEO do Facebook, que afirmou em 2009 que “a era da privacidade acabou”? Meyer acredita que o sentimento estranho de que “alguém está me observando” vai sumir conforme as tecnologias permitam um controle maior sobre sua privacidade.
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