Ao apagar das luzes de 2011, o Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor (DPDC) do Ministério da Justiça, lançou por meio da Escola Nacional de Defesa do Consumidor a segunda edição do caderno de investigações científicas “Proteção de Dados Pessoais: Para além da Informação Creditícia”. A publicação tem como objetivo subsidiar a reflexão sobre a titularidade do consumidor sobre seus próprios dados pessoais.
O lançamento ocorre no momento em que a sociedade brasileira discute a edição de um marco regulatório sobre proteção de dados pessoais. Um anteprojeto de Lei sobre a matéria passou por debate público em 2011 e contou com mais de 800 contribuições da sociedade. A publicação de uma nova versão do projeto, incluindo boa parte dessas contribuições, é aguardada para o início deste ano.
A publicação do DPDC discute a necessidade de proteção dos dados de consumidores nas diversas situações em que seus dados pessoais são coletados e utilizados. “A discussão sobre proteção de dados é necessária porque há uma nova situação de vulnerabilidade do consumidor diante do comércio eletrônico, da publicidade comportamental e até das redes sociais, por exemplo”, comenta o coordenador-geral de Supervisão e Controle do DPDC, Danilo Doneda.
Sem dúvida, estamos vivenciando a distopia do megamercado, onde o conceito de privacidade começa a mudar radicalmente. Onde como bem disse o jornalista e mestre em comunicação Gustavo Gindre, em um dos primeiros seminários sobre proteção de dados que assisti, funções que até então eram do estado passaram a ser assumidas pelas empresas que, por sua vez, têm uma necessidade brutal de consumir informações e controlar informações que fazem girar o mercado na forma do consumo.
Sem que percebessemos claramente, o conhecimento, a psicologia, deixaram de ser os da massa e passaram a ser o de cada indivíduo, seus gostos, seus desejos, etc, para gerar um produto para cada um desses gostos, desses sujeitos específicos.
O grande problema é que enquanto temos uma prevenção muito grande contra o estado totalitário, e devemos ter e é justificável que a tenhamos, temos muito poucos anticorpos sociais para esse mesmo papel totalitário quando ele é exercido pelas empresas.
A Internet possibilitou o advento do que Gustavo Gindre denomina de “mercado secundário de dados”, que já começa a movimentar recursos consideráveis. A empresa BlueKai, que se anuncia como uma bolsa de valores de dados, seja talvez o melhor exemplo deste fenômeno. Ela recolhe dados de fornecedores como a Nielsem, e os vendes, a partir de determinados perfis definidos pelo comprador da informação.
As formas como essas informações passam a ter utilidade são bastante preocupantes. Uma seguradora pode, através do conhecimento do perfil de consumo de um cliente, definir o risco potencial de risco de vida para defnir preços para um mesmo perfil de idade, etc.
Quais as salvaguardas para o cruzamento exponencial de informações nesse mercado secundário de dados? Qual o tratamento que será dado ao dado, quem dará esse tratamento e para que finalidade? Como fechar a porta para que dados sensíveis possam parar no mercado secundário de dados, trocados como moedas?
Muitas dessas questões foram levantadas durante a consulta pública sobre o anteprojeto de Lei de Proteção de Dados Pessoais. E algumas delas são abordadas na publicação, que será utilizada pela Escola Nacional de Defesa do Consumidor em suas oficinas e cursos para o Sistema Nacional de Defesa do Consumidor, coordenado pelo DPDC e composto por Procons, Ministério Público, Defensoria Pública e entidades civis de Defesa do Consumidor. O primeiro curso será realizado em março de 2012.
Convém acompanhar de perto as discussões. Sobretudo aquelas que definirão se a compra e venda de dados será autorizada. E de que dados. Que informações sobre nós correm o risco de virar uma commodity. E quais devem ser públicas. É preciso evitar que os operadores do mercado secundário de dados passem a gerar antídotos e esses mesmos mercados secundários e, portanto, passem a ganhar nas duas pontas, ao vender e a impedir que os dados sejam vendidos.
PS: O Ministério da Justiça marcaria um golaço se colocasse o PDF da cartilha disponível para download no site da Escola Nacional de Defesa do Consumidor, não acham?
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